Número 268

GRAVANDO

Hormônios. Aí está a desgraça do homem. É por causa deles que o macho da espécie não sossega, procura o acasalamento e, em sua forma mais radical, o casamento. Não sabe o perigo que corre… Sua fêmea, que também atende ao chamado da natureza, tem – em média – menor tamanho, menos força, agilidade e explosão. Em tese, estaria em franca desvantagem na união (até está, quando casada com um covarde). Porém, conta a seu favor com uma arma sorrateira – a memória invejável.

Quer uma prova? Pergunte ao homem a cor do vestido de sua mãe ao levá-lo ao altar. Não saberá. Depois, pergunte à mulher o máximo de detalhes sobre o vestido daquela prima em segundo grau que só foi convidada porque dificilmente viria do interior. Ela dirá até a cor da gravata do namorado atarracado que trouxe a tiracolo e se tornou o furor do buffet.

Pois é: gravar tudo é o grande poder das mulheres. E não se iluda pensando que estão ligadas apenas em detalhes frugais, como vestidos, sapatos e penteados. Ao contrário, o grande banco de dados é auditivo. Como isso acontece o tempo inteiro, mais dia menos dia os homens baixam a guarda, cometem inconfidências e se tornam reféns. Por exemplo, na vez em que o casal aguardava a audiência de conciliação para o divórcio amigável. Antes de entrarem, ela o chama para uma conversa ao pé do ouvido:

– Eu estava gravando tudo.
– Tudo? Quando?
– Sempre.
– Desde o começo?
– Ahã.
– Duvido!
– Pergunte, então…
– O que eu disse na primeira noite?
– “Não entendo: isso nunca aconteceu comigo antes”.
– Foi, é?
– Foi. E o que falou para a mamãe quando a conheceu, lembra?
– Claro que não!
– “Deveriam processar o cabeleireiro da Farah Fawcett-Majors”.

Diante do Meritíssimo, a esposa pede uma pensão escorchante, o apartamento, a casa na praia e as ações da Petrobrás. O marido consente sob o olhar incrédulo de seu advogado. Na saída, puxa a ex-mulher para um canto:

– Vem cá, tem um problema nessa história: eu não lembro de ter falhado na primeira vez.
– Quem disse que falhou? Foi ótimo, aliás.
– Mas, e a frase gravada?
– Você comentava sobre a rolha que se partira ao meio.

3 comentários em “Número 268”

  1. Cândida Laner Rodrigues

    Hahah muito bom!! Ótimas crônicas Rubem!
    Participei do café cultural no Sesc – Passo Fundo com a sua ilustre presença e adorei! Sua fala foi a menos “teórica” e a mais divertida de todas!
    Vc tem a minha mais sincera admiração (que chique hehe), continue assim 🙂

  2. Cândida,
    Fico muito feliz que tenhas gostado do Café Literário! (eu estava até meio inseguro em meio aos ilustres colegas)Também é muito lisonjeira sua admiração – chiquérrima, aliás.
    Um grande abraço,
    Rubem

  3. Oi Rubem!
    acabei me divertindo com muitos acrosticos, ateh influenciando amigos a fazer tb eheheh
    mas o texto.. nao sei se seria uma cronica… acho q eh mais pra conto mesmo.. mas ateh sexta, ops, amanha! acho q pode surgir outro se necessario…

    publiquei eles, se quiser conferir… http://almacronica.blogspot.com/

    e q nenhuma rolha mais quebre ao lado de uma mulher vingativa!

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