Crônica publicada no jornal Metro em 01.10.2013
Gosto muito de escutar as opiniões das autoridades sobre segurança pública. Parecem especialistas em isentarem-se de responsabilidade, atirando a culpa pela violência no colo dos outros. E não quaisquer outros: das vítimas. Quem edifica uma bela parede branca, pede uma pichação. Quem permanece dentro do carro enquanto a namorada desce do apartamento, espera ter o carro roubado. Quem anda inadvertidamente na rua, suplica por um punguista. Quem veste tênis de marca, usa joias ou manipula smartphones em público, jamais pode se queixar. São pessoas que provocam.
Mas não são apenas as pessoas que andam abusadas: as coisas também perderam a noção do perigo. Onde já se viu prédio de escola sem um guarda fardado na entrada? Quem imagina um banco sem portas com detectores de metal? Ou uma janela no térreo (em alguns casos no segundo ou terceiro andar) sem grades? Onde já se viu uma farmácia sem câmeras de vigilância? Como pensar num prédio de classe média sem guarita blindada? Que automóvel teria coragem de sair da fábrica sem alarme, trava antifurto e, dependendo do modelo, GPS? Tudo o que estiver demonstrando fragilidade é porque, no fundo, pede a ação dos fora da lei.
A neurose da violência urbana pune apenas o cidadão cumpridor da lei. Verdadeiramente é ele quem está atrás de grades, cerceado em seu direito de ir e vir, exposto ao medo de se comportar mal – ao menos mal nesta lógica perversa dos que culpam a vítima. Acho que já escrevi isso antes, mas se me repetir não será em vão: em algum momento, nosso país achou mais lógico gradear todo mundo ao invés de manter presos uns poucos que mereceriam. Entre investir em escolas ou em prisões, escolhemos não investir em nenhum dos dois. Basta culpar a desigualdade social (como se bandido e pobre fossem sinônimos).
Agora, voltamos a debater o fechamento do Parque da Redenção à noite. Mais grades. Menos liberdade. Tudo muito lógico: se ninguém entrar no parque, ninguém suja o parque, ninguém estraga o parque, ninguém assalta no parque ou faz sexo no parque. Puna-se a todos ao invés de punir alguém. Onde já se viu um parque aberto? Está pedindo! Claro que tudo ainda pode piorar: sou obrigado a concordar com isso para ter (ou não) uma Redenção limpa e intacta. Porém, seguindo nessa onda, em breve os vereadores votarão o toque de recolher oficial como ação preventiva. E haverá quem defenda em nome da segurança.