Paraquedas, maconha e bungee jump
Rubem Penz
Neste momento pode parecer até engraçado, ingênuo, bobo. Mas é a pura verdade: não fumei maconha nessa minha existência, nem mesmo na juventude, por razões parecidas com as quais, ao ser convidado, deixei de fazer um curso de paraquedismo, e jamais cogitei saltar de bungee jump. Tudo atrelado, também, a uma má experiência com tobogã – ainda que essa seja uma história para outro dia. Enfim, não é uma caretice qualquer, é uma caretice com fundamento. Desenvolvo o raciocínio.
Desde muito cedo, não consigo precisar uma data, cultivei a certeza íntima de que nasci com uma espécie de sina (ia dizer maldição, mas, além de impreciso, o termo leva para os contos de fadas, e não é o caso). Nela, a convicção de que, se alguma coisa pode sair bizarramente errado, será comigo, deixando-me prudente na vida. Ainda assim, já rodei diversas vezes no vestibular para presunto – olhares em retrospectiva vislumbram um pouco recomendado pendor para situações de risco. Ou seja, mesmo cercado de cuidados, quase parti para a terra dos pés juntos com uma frequência preocupante. Imagina só se não fosse prevenido.
Bem ou mal, tornei-me um louco de cara.
E onde a cannabis sativa entra no enredo?
Bom, lá no final dos anos 1970, início dos 80, quando eu era um típico adolescente propício aos experimentos extracurriculares (adoro eufemismos), havia a presença constante de policiais nas ruas, os Pedro & Paulos – de todos, o termo mais católico a nominá-los. Era voz corrente entre nós a predileção das duplas por aplicarem corretivos físicos no intercurso da detenção de maconheiros. Não que a meninada terminasse presa de fato, ainda que isso fosse uma possibilidade real. Certo, certo mesmo, era levar uns cascudos. Eu, branquinho, cabeludo, franzino e com cara de classe média, representava uma espécie de cereja do bolo em abordagens desse tipo – como se existisse para descobrir, através da pesada mão da Brigada Militar, o que era bom para a tosse.
Logo, tão lógica quanto a vitória pessoal do Figueroa sobre os atacantes adversários, estivéssemos num grupo de sete, dez, trinta pessoas, seria eu aquele que, chapado, terminaria dentro de um camburão. Em outras palavras, morrer de medo da truculência policial fez de mim um rapaz cumpridor da lei. Isso pode não ser o mais adequado método pedagógico a se almejar, porém, funcionou. Bem ou mal, tornei-me um louco de cara.
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Corta para os dias de hoje. Uma manchete pouco destacada informa que uma juíza soltou meia dúzia de pessoas suspeitas (adoro eufemismos) de serem traficantes ao desembarcarem mais de quatro toneladas de maconha. Razão: alegaram na audiência de custódia terem sofrido agressões durante a detenção, o que, caso fosse comprovado, deixaria ilegal o flagrante ao delito. Opa! Quem sabe seja a hora de eu rever conceitos, procurar um curso de paraquedismo ou saltar de bungee jump. Afinal, com anda a coisa, o Poder Judiciário pode estar em vias de revogar, incrivelmente, a Lei da Gravidade.
Falaste tudo Rubão!
Valeu, Maurício! Abraços!