– É sobre a opressão da juventude! – exalta-se o homem maduro ao microfone. – Outrora mantínhamos algum valor. Nem me refiro aos tempos áureos em que a experiência denotava virtudes incontestáveis, pois reconheço os questionamentos como salutares. O grave é que, hoje, sequer respeito nos é devido.
Eu acompanho as manifestações de uma cadeira ao fundo na fila mais lateral do Salão Fictício, área nobre do Hotel Imaginário. Observo as cabeças anuindo e, pela aparência, eu seria um dos mais velhos ali presentes. Não só pela aparência: também por utilizar nesta fantasia termos como outrora, denotar ou anuir. Um dinossauro. Daqueles de pequeno porte, mas ainda dinossauro.
Já houvera escutado uma explanação assaz interessante sobre o sapatênis. Segundo o palestrante que defendia a peça de vestuário contra as constantes blagues, “estar equidistante do calçado esportivo e social é algo mais do que uma opção de conforto: representa um dar-se conta de os homens terem um pé na novidade e um pé na tradição, uma personalidade equilibrada entre a impetuosidade e a segurança”. Logo, isso jamais poderia ser visto como motivo de piadas maldosas.
Antes, a defesa de um constante suéter nos ombros também provocara aplausos. Segundo a tese apresentada, este hábito substituiu com ares de leveza a quase obrigatoriedade dos paletós no tempo dos pais e avós. Os suéteres poderiam trazer cores vivas e novas combinações com as camisas e calças. Quando alguém da plateia disse que lamentava a perda dos bolsos, no bate-pronto foi lembrado de que os celulares haviam incorporado toda sorte de objetos – os cinco bolsos se tornaram dispensáveis.
De todas as palestras programadas, todavia, a mais aguardada seria a do sexólogo que denunciara num artigo como evidente etarismo o julgamento de o desejo masculino precisar ser desligado a partir dos quarenta, cinquenta anos de idade. Segundo suas palavras, “a priori, manter a disposição ao ímpeto da carne é apenas um sinal de saúde”. Havia também uma tabela relacionando o desejo, a longevidade, a felicidade e a prosperidade.
Porém, um problema de última hora fez com que os organizadores do ciclo de palestras mudassem a grade. O tal sexólogo estava na emergência cardiológica depois de, no mesmo dia, ter assinado os termos do divórcio litigioso e ter recebido a fatura do cartão de crédito. Enfim, no momento, seu ímpeto e disposição à carne não pareciam ser um bom exemplo de longevidade, prosperidade ou felicidade.
Estou curioso: no seu lugar, virá a ex-esposa com a temática “Olhe para o lado antes de reclamar”. Subtítulo: “ E ai de quem deixar o recinto”. Alivia-me constatar o conforto das nossas cadeiras.