Número 327

NA HORA DO SALTO

E o beijinho vai para quem?
Xuxa

Um dos grandes feitos de nossa história recente completa quarenta anos em 2009: a chegada do homem à lua. Ação importante na trincheira científica da Guerra Fria, o pouso do Módulo Lunar da espaçonave Apollo 11 foi um dos primeiros fenômenos de comunicação de massa, acompanhado por milhões de pessoas em escala global. Conscientes da relevância do momento, os norte-americanos buscaram capitalizar o máximo de proveito do episódio, principalmente depois de assistirem ao soviético Yuri Gagarin ser o primeiro homem a alcançar o espaço a bordo da Vostok 1, em 1961. Desde então, pairava pelos corredores da NASA, tal qual o sussurro de um fantasma, a marcante frase do orbitante Gagarin: “A Terra é azul, mas não há Deus”.

Assim, tanto quanto os estudos técnico-científicos que permitiram aos astronautas pousarem e decolarem em segurança do solo lunar, os aspectos de comunicação também foram minuciosamente planejados. Filmagem, transmissão, bandeira, fotos, tudo pensado para enriquecer a História com informações e símbolos relevantes. Nos poucos anos que separaram as expedições de Apollo e Vostok, muito havia se avançado em termos de comunicação, o que permitiria uma visibilidade extrema. E, necessariamente, uma nova frase haveria de suplantar a anterior: “Um pequeno passo para o homem, um grande salto para a Humanidade”, dita por Neil Armstrong.

Por uma questão de romantismo, quero crer que os astronautas foram os autores das duas belas frases. No fundo, claro, e muito por causa da força de ambas, existe a possibilidade de alguma delas ter sido previamente criada. Soube de uma especulação em que o próprio Armstrong teria dito de forma errônea o texto decorado, trocando o correto “um homem” por “o homem” na primeira parte de seu enunciado. Aqui e agora, o mais importante para mim é exaltar a eficácia das palavras que foram proferidas em tais momentos cruciais para a Humanidade. Em igual proporção, louvar as frases marcantes de nossa vida, venham elas de iluminados improvisos ou ensaiadas linhas. Ao mesmo tempo, e por consequência, lamentar que tantas pessoas perdem essa oportunidade de ouro.

Por exemplo, o que acharíamos da seguinte cena: abre o microfone de dentro do capacete do primeiro homem a pisar em Marte. É dele o minuto para ser escutado por todos. Então, vemos o herói tirar do bolso do macacão espacial um papelzinho dobrado, enquanto confessa meio constrangido que precisa de uma “colinha”, mesmo tendo dias e dias para ensaiar suas palavras. Com a voz trêmula de emoção, ele agradece à sua avó, que tanto o incentivou desde os primeiros anos escolares; à sua mãe, que não poupou sacrifícios para que ele chegasse até ali; ao seu pai, esteja ele onde estiver, pelo exemplo; aos seus irmãos, pela camaradagem, e, finalmente, à sua noiva, que abriu mão de muitos finais de semana com ele enquanto estava se dedicando aos exaustivos treinamentos no Centro Espacial. Ah, em desagravo a Gagarin, agradeceria também a Deus: sem Ele, nada alcançamos.

Pois é… Aproxima-se o momento da série de cerimônias de formatura nos mais diversos cursos superiores. E, fazendo questão de acompanhar uma das benquistas professoras da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), minha esposa, já estou preparado para escutar dezenas de vezes palavras, se não iguais, muito semelhantes àquelas que coloquei na boca do nosso hipotético homem que pousou em Marte. Por isso, minha vontade seria, antes, chegar aos alunos planejam sua colação de grau e pedir: pelo bem comum, que os formandos tenham direito a vinte, no máximo trinta palavras individuais no púlpito – maior extensão cabe, no protocolo, ao orador da turma. Depois, mostraria o magnífico poder de síntese das frases do soviético e do americano. Por fim, explicaria que, para eles, a formatura será o momento do primeiro grande salto de suas vidas, um instante que ficará para sempre. Logo, é a hora exata para falar pouco, todavia muito, muito bem. Este sim, um belo presente à mamãe!

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