NÃO SEI EM QUEM VOTAR*
Rubem Penz
Esta é uma obra dedicada ao nosso sistema político e partidário que, mesmo imperfeito, não pode ser responsabilizado pelas falhas dos homens que o denigrem ainda mais a cada pleito. Nasceu para ser interpretada por um eleitor e um político – candidato ao Legislativo ou Executivo, tanto faz. Como foi escrita para ambos, é possível depreender o nome da dupla: Caracu. O político é o cara. O eleitor entra com o talento que lhe resta.
Eleitor: — Eu sei que vou votar…
Político: — Eu sei que vais votar…
Eleitor: — Por toda a minha vida eu vou votar…
Político: — É nossa salvação regimentar.
Eleitor: — Em cada escurtínio eu vou votar…
Político: — Encare o sacrifício de votar.
Ambos: — Democraticamente, assim se vai votar!
Eleitor: — E cada voto meu
Político: — E cada voto teu
Eleitor: — Será
Político: — Será
Eleitor: — Pra mal dizer
Político: — Pra eu poder
Eleitor: — eu não saber votar…
Político: — só me locupletar…
Ambos: — … por toda minha vida!
Eleitor: — Eu sei que vou chorar
Político: — Eu sei que vais chorar
Eleitor: — A cada ausência tua, vou chorar
Político: — A cada ausência minha, vais chorar
Eleitor: — Mas cada falcatrua há de custar
Político: — Mas cada falcatrua há de gerar
Eleitor: — Bem mais que tua ausência me custou
Político: — Bem mais do que a campanha me custou
Eleitor: — Eu sei que vou sofrer
Político: — Eu sei enriquecer
Eleitor: — A eterna desventura de viver
Político: — Na eterna boaventura de viver
Eleitor: — A espera de te ver ao lado meu
Político: — A espera de viver salvando o meu
Ambos: — Por toda nossa vida…
*Paródia propositalmente sofrível, pois sofrida, de Eu sei que vou te amar, de Tom Jobim e Vinícius de Moraes