Perguntas que já contêm respostas

Número 439
Rubem Penz
Há perguntas com respostas embutidas, ocultas, tácitas. Nem precisariam ser feitas, mas fazemos. Algumas são clássicas. Outras, denunciadoras. No fundo, servem apenas para nos conformarmos. Ou, quando o estratagema cola, para tirar o corpo fora. Senão, vejamos:
Eu preciso mesmo ir?
Está na cara que precisa. Quem pergunta sabe muito bem disso. Eis a razão de perguntar. Porém, o que está sendo sonegado é: eu não quero ir. Se o interlocutor diz sim, você vai obrigado. Caso a resposta seja não, fica (sem culpa).
Tem que ser agora?
Súplica típica dos homens. Acontece no calor da hora, colada no prazo ou mesmo em seu prejuízo. Quase sempre é respondida (por elas) com ironia: não, quem sabe demora mais dois anos…
Posso deixar assim?
Podendo, não seria preciso nem perguntar. Deixava e pronto, sem dar ou pedir permissão. Tentativa inútil. Ou, claro, a intenção é que outro deixe diferente – do jeito que deveria ficar.
Vai dar problema?
Claro! Você sabe que vai. Se não der, foi por pura sorte. É a voz da sua consciência gritando o alerta: assim, vai dar problema. Você pergunta para terceiros apenas para ter uma segunda opinião.
De quem é a vez?
Digamos que tenha uma mesa de cartas. Todos concentrados. Quando, de repente, alguém pergunta: de quem é a vez? Óbvio: é de quem perguntou!
Você quer, mesmo? (Às vezes, junto com: tem que ser agora?)
Típica feminina. O outro não aguenta mais de tanto querer. Esteve disposto a qualquer negócio para ser atendido. E vem o último pedido de confirmação. Não precisava. É crueldade.
É comigo?
Todos estão olhando para você. Não há mais ninguém por perto. Já foi a vez de todo mundo. Seria com quem mais? Então, por que razão perguntar?
Vai doer?
Vai. Talvez um pouco, talvez muito. Você pergunta na vã tentativa de se iludir.
Vai demorar?
Vai. Talvez um pouco, talvez muito. Você pergunta na vã tentativa de se iludir.
Vai ser caro?
Vai. Talvez um pouco, talvez muito. Você pergunta na vã tentativa de se iludir.
Vou me arrepender?
Vai. Talvez um pouco, talvez muito. Você pergunta na vã tentativa de se iludir.
Vai durar?
Não. Claro que não.

***

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