As lições do bumerangue

Rubem Penz

Pouca gente no Brasil já teve um bumerangue nas mãos. Destes, um número menor com a oportunidade de arremessá-lo. E a quantidade cai consideravelmente quando entra o sucesso na parada: jogar e pegar outra vez, de volta, sem que ele toque o chão. Ou – estupendo! – no mesmo lugar de partida, nem um passo para lá ou para cá. Não é uma proeza que se possa dizer fácil: carece de um bumerangue bem construído, estudo e algumas horas de prática. Porém, posso garantir que a sensação é deliciosa. Como sei?

Faz cerca de 25 anos criei para a agência de propaganda em que trabalhava uma campanha institucional que dava um pequeno bumerangue profissional como brinde. Antes, eu mesmo adquiri um e comecei a praticar no Parque Marinha do Brasil. Foi o modo de compor uma pequena aula para fazer parte do pacote, no intuito encorajar o público alvo a jogar também, com um mínimo de competência. Empreendia no projeto muitas horas extras – eu era um jovem redator idealista e esforçado. Praticar bumerangue passou longe de ser um sacrifício, e a verossimilhança estava garantida: viesse o cliente saber se daríamos retorno, era só me acompanhar até o parque.

Raras vezes temos a chance de vivenciar metáforas. De forma saudável, então? E, de fato, a metáfora do bumerangue é poderosa. Ele, sozinho, não passa de um pedaço de madeira cortado em forma de “L” e esculpido para formar uma espécie de asa ou hélice. Por si, jamais voará. Muito menos retornará sem que tenha partido com o movimento certo. Além disso, antes de arremessá-lo, é preciso verificar de onde sopra o vento e sua intensidade. Tudo isso influencia a estratégia e o resultado. Na prática, aprendemos que o sucesso é posterior ao trabalho de estudar o que deve ser feito, praticar (aperfeiçoar-se) e dosar os esforços. Assim, voo e pouso passam a ser previsíveis. Quase um detalhe.

Aconteceu muita coisa durante a Copa do Mundo do Brasil. E, aplicando a lógica do bumerangue, tudo o que deu certo foi como um voo antecedido de decisões e práxis corretas. O que deu errado, e nisso podemos colocar desde o desempenho do time aos escândalos administrativos, resultou de equívocos na origem. Quem esperava aquele giro perfeito e uma taça repousando suavemente nas mãos do Tiago Silva é porque não viu como a coisa tinha partido. Ou não queria ver. Ou acreditava em milagre. Fosse comigo ao parque, eu explicaria. Aliás, foi bom ter voltado ao assunto: deixei a agência antes de ter a oportunidade de mostrar como éramos bons em comunicação. Pois é. O bumerangue, o esporte e a vida ainda precisam lidar com variáveis fora do nosso controle…

Crônica publicada no Metro Jornal em 15.07.2014

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