Rubem Penz
Começamos em casa a ver a série “La casa de papel” no Netflix por causa do bom trailer e comentários favoráveis. Também, é claro, por um fascínio todo especial pelas tramas que envolvem sofisticados assaltos, capazes de nos fazer torcer a favor do trambique, contra a polícia e a justiça (na ficção, gente, só na ficção). Porém, notando a quantidade de pessoas a compor a quadrilha liderada pelo “Professor”, por pouco não desisti: muitas personagens, sofreria para decorar quase um time de futebol. O que me tranquilizou? A estratégia do criador, Álex Pina, em nominá-los como cidades. Num só tempo, nos ofertou traços de personalidade e bons paralelos para ganchos mnemônicos. E passamos a acompanhar os anti-heróis Tóquio, Rio, Nairóbi, Oslo, Berlim, Moscou…
Enquanto comentava sobre a excelente ideia, foi-me perguntado: qual cidade escolheria para ser? Pergunta difícil. Qual traço de personalidade gostaria de marcar como predominante? Sou metrópole? Sou lugarejo? Serei periférico ou referencial? Antigo, novo, reconstruído após alguma das grandes guerras? Estarei em ruínas? Submerso? Bairrista ou universal? Quem porcaria de cidade seria eu?
Como não consegui responder, fiquei dedicado às grandes exclusões. Primeiro, ao escolher entre a previsibilidade dos pequenos municípios ou a caótica ordem metropolitana, descartei os primeiros – sim, tal qual um grande amigo, sou demasiado urbano. Daí, olhando o Atlas, desisti a priori de todo o Oriente, Índia, Oriente Médio, América do Norte, África, Oceania e ambos os polos – muito frio, muito pouca gente em volta. Quando dei por mim, estava entre a Europa Ocidental e a América Latina. Nem assim parecia fácil.
Tem dias que acordo meio Roma – ambíguo, multifacetado. Outros, barcelonicamente intenso e solar. Há momentos de melancolia, e sou Lisboa. Ora pareço pretencioso feito Buenos Aires, ora organizado – Zurique. Sou São Paulo quando tudo quero (já que descartei Nova York), sou bem o Belo Horizonte que nunca fui e tanto gosto (aliás, há quem, por conhecer ambos, defenda combinar muito comigo). Se Mônaco, jamais teria paz – já me sinto uma fraude sem esse luxo todo. Quisera ser Salvador, mas ninguém (nem eu) acreditaria. Muito complicado.
Montevidéu: eis uma escolha e tanto. Nova e antiga, fria e quente, simpática, acolhedora, meridional… Ainda assim, serei mesmo? Quando já pensava em desistir, um lampejo: Vitória! Sequer conheço a capital capixaba, pensei apenas no bom presságio.
E você? Qual cidade seria?
Crônica publicada no Metro Jornal Porto Alegre em 06.02.2018