Um inventário maledicente de tipos

Um inventário maledicente de tipos*

RubemPenz

Corações sensíveis e amantes do politicamente correto, cuidado. Afinal, neste bonde sem freios ousarei revelar que, sim, dizemos que alguém é magro, nanico, careca ou vesgo, especialmente quando é. Ou mesmo tímida, desajeitada, pernóstica, teimosa. São traços físicos e de personalidade que se destacam para facilitar nossa vida. Preguiçosas e ferinas reduções. Mas há algumas expressões que também definem tipos, facilmente reconhecíveis, ainda que seja muito feio a isso reconhecer. E, já que estou ousando, segue:

Tipo “vai indo que já vou”: aquela pessoa a qual, quando compõe conosco um grupo de trabalho, compreende bem pouco o sentido da palavra grupo, e absolutamente nada as implicações da expressão trabalho.

Tipo “daqui ninguém me tira”: um indivíduo que tem plena consciência de estar fora de lugar (literal ou metaforicamente), mas nem assim, ou justamente por isso, topa mudar de condição. Não adianta buscar o Papa.

Tipo “peraí, deixa comigo”: eis uma temeridade ambulante, pois se constitui no voluntarioso despreparado. Inconsequente, colocará tudo a perder e precisará ser socorrido em minutos. No fundo, é uma espécie dissimulada de suicida (metafórica ou literalmente)…

Tipo “duvido que você consiga”: amigo da onça, empenha-se em ver o outro se estrepar (sabendo que se dará mal). É movido pelo mais legítimo espírito de porco. Se for preciso, insistirá mil vezes, apelando para chantagens sobre a masculinidade, por exemplo.

Tipo “por que não me avisaram?”: é aquele que nunca pede sua opinião, faz questão de bancar tudo guiado pelos seus instintos (crenças, palpites, suposições) e, quando dá porcaria, terceiriza a responsabilidade na maior cara de pau.

Tipo “agora!, ainda não!, agora!, espera!”: o pernicioso casamento de complexo de maestro com indecisão crônica produz um dos indivíduos menos úteis para termos ao nosso lado na hora de fazer algo delicado, difícil ou arriscado. Aquele nem decide, nem desocupa a moita.

Tipo “olha lá, ela está te dando bola!”: variação igualmente sádica do tipo “duvido que você consiga”, este falso parceiro tem prazer quase sexual em ver o amigo dar vexame. Assim que o convence a agir, chama uma plateia para curtir a iminente tragédia.

Ah, e um dos piores, o tipo “sabichão engraçadinho”: rápido nas tiradas, adora fazer ironia, vê piada até nas maiores catástrofes e morreria em segundos se mordesse a própria língua. Deve ser mantido sob o severo controle do superego. Costuma escrever crônicas.

*Publicada originalmente no Metro Jornal em 03-06-2014

gostou? comente!

Rolar para cima