É cerâmica ou vime?

Todos os que já contraíram núpcias (a-do-ro essa expressão) e completaram nove anos em matrimônio viveram as bodas de cerâmica ou vime. Se você estranha a existência de duas opções, a moda já começa no terceiro ano com o trigo ou o couro. Também aparece no quarto, quinto, sexto, sétimo e oitavo aniversários de casamento, além de outras marcas adiante. Fixo-me, todavia, na dupla vime e cerâmica como metáforas, pois compõem a mais radical diferença.

A cerâmica, areia cristalizada pelo calor, aparece para significar a solidez do casal ao fechar o nono ano de convivência. Mas, exatamente por isso, ela é altamente quebrável. O vime, ao contrário, demonstra como se precisou ser moldável e flexível para abrir o décimo ano de união. Neste momento, fiquei confuso: o que comemorar? Solidez ou flexibilidade? Moldagem ou cristalização? A escolha, ao que parece, é do freguês.

O recrudescimento da calvície, por exemplo, é administrado porque o vínculo é firme e capilaridades não interferem nas coisas do amor, ou graças à flexibilização dos valores estéticos? Afinal, um topete pode ter sido importante na conquista. Fica a dúvida.

E na balança? Já ouvi pessoas dizendo terem se casado vinte quilos atrás, não enumerando os anos transcorridos. Dependendo da idade em que estavam, é muito fácil serem impactados pelas mudanças hormonais e de metabolismo. Vime ou cerâmica?

E os abalos financeiros? Em nove anos, tanto se pode escalar a pirâmide social quanto dela despencar. Em tempos voláteis, até ambos, seja em que ordem acontecerem. Escolha: suportar a imprevisibilidade é uma característica de solidez ou de adaptação?

Ao que parece, assumir dívidas e longo prazo, como um financiamento imobiliário, seria fácil acomodar na metáfora da cerâmica. Para a maioria dos casais, no entanto, a reserva de parte considerável do orçamento em décadas implica renunciar a outros destinos, como viagens, automóveis novos etc. Vime?

A chegada dos filhos é, sem dúvida, o maior desafio. Desde a gravidez, desloca-se para sempre o centro gravitacional da casa, agora tornando o que era casal em família. Quando minuciosamente planejada, a mudança de status pode ser computada como firmeza. Contudo, haja flexibilidade…

Domingo passado completamos bodas, Vanessa e eu. Devo dizer que nada do que coloquei acima foi experimentado com radicalismo – ou, só a chegada da Agatha. Ainda assim, sou forçado a discordar frontalmente da instituição que criou a duplicidade das metáforas. Não onde você imagina. Discordo do “ou”. Trocassem por “e” estaria mais bem atendido.

Parapenz, meu amor!

8 comentários em “É cerâmica ou vime?”

  1. Parabéns a vocês, Rubem e Vanessa, um belo casal. Quanto à crônica, reflexão precisa. É isso mesmo: a soma das metáforas descreve melhor o processo da vida a dois. Já temos, aqui, Washington e eu, mais de três décadas na caminhada, embora sem filhos, e seguimos carregando nossas cerâmicas em balaios de vime. 😉 É sempre bem legal ler as suas crônicas.

    1. Cristina, parapenz pra ti e para Washington – três dácadas é um marco de respeito!
      Fico sempre feliz em merecer sua leitura. Abração!

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