Número 358

FORÇA VERSUS JEITO

De todas as virtudes de um humano masculino, a mais festejada continua sendo a força. Não importa quantas ferramentas criamos para substituir, com ampla vantagem, nossos músculos: um bíceps bem formado, rijo, saliente, segue campeão de audiência. Antes que os defensores incondicionais da inteligência considerem tal premissa um absurdo, antecipo-me respondendo que nada é mais inteligente do que cuidar minimamente do corpo. E, na hora certa, mesmo com moderação ou sutileza, quase como quem pede falsas desculpas, dar uma cabal demonstração de força. É uma delícia para a auto-estima. É sexy. Dependendo, é tão útil quanto necessário.

Ser forte, porém, não deve justificar a brutalidade. Ao contrário: junto com a rigidez muscular, deve vir o controle de cada gesto. Conheço grandes homens (literalmente) cujos movimentos e, principalmente, intenções são de uma delicadeza ímpar. Outros, mirrados – intelectuais! –, são rudes e desastrados. O grande equívoco é pensar que a força física, atributo tão caro na evolução da espécie, deva ser abandonada para tornar alguém civilizado. Ou, pior, seja motivo de estereótipo. A rápida ascensão das mulheres no mercado de trabalho pode indicar, falsamente, que o homem de sucesso deva se render a um modelo de fragilidade física. Por trás dessa ideia, a falácia de que não é possível conciliar força e jeito.

Sim, existe uma rede de intrigas sendo urdida – uma hipótese – naqueles encontros no banheiro das damas: opor a força e o jeito de modo a torná-los excludentes. Elas, sabendo que na média não conseguem ser tão fortes quanto os homens, tomam para si a hegemonia da delicadeza. No fundo, almejam nossa renúncia à potência muscular para, só então, avançarmos nas tarefas sutis. Uma verdadeira castração, falsa como cinco ases. Eis um pequeno exemplo de harmonização tipicamente masculina: alguém já reparou que o homem jamais bate a porta do carro? Diferentemente das mulheres, que oscilam entre muita e pouca força, nós sempre sabemos impor a medida correta. Meninas, agora o horror: quando o automóvel não é nosso, intuímos a força ideal. Isso mesmo: existe intuição masculina!

Quando o homem, além de forte, é seguro, a estratégia muda: elas nos reduzem à condição de músculo ambulante. Como prova, as frases ditas em tom de piada, do tipo “se não conseguir destampar esse vidro de conservas, pode ir embora – foi-se a derradeira utilidade”, ou “a porta emperrou: abre ou eu chamo um homem de verdade”. Experimente dar um ultimato na esposa: pregue esse botão aqui, ou vou procurar uma mulher de verdade! Cai a casa! Logo, ou a tática de redução vale para os dois, ou não vale para ninguém. Além do mais, aposto todas as minhas fichas no marido pregando seu botão sozinho muito antes de a esposa desemperrar a porta sem auxílio (ok, peguei pesado).

Fisiologicamente, o último bastião da masculinidade é a força. Perderemos a flexibilidade, a agilidade, a resistência e até a precisão antes de nos despedirmos da força. Por isso minha revolta ao perceber que existem homens que aceitam abrir mão dela para competir com as mulheres. Que vergonha! Sejam delicados, suaves, minuciosos e, também, fortes. Curtam, até o fim da vida, o brilho que nasce no olhar das fêmeas quando vêem nossa musculatura retesar-se. Elas, lamentavelmente, não costumam creditar a nós a acuidade para reparar em algo tão sutil!

2 comentários em “Número 358”

  1. De tão boa, terminamos e queremos voltar e reler de novo.
    É inteligente, divertida, verdadeira, leve e nos faz ver os dois lados da moeda.
    Consegue ser real sem ser sectária.
    Adorei.
    Dá vontade de degustar de canudinho!
    Parabéns!
    Carmen Macedo
    01/03/2010

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