IRRESISTÍVEL
Você mesmo já presenciou esta cena – quando não foi o protagonista: no tradicional passeio pelas areias do litoral, o olhar abandona o curso ao ser atraído por algo completamente irresistível. Sim, está ali, repousando na areia como que chamando para uma conferida. Não é nenhuma novidade, em quase nada se difere de outros, vemos muitos durante a vida, é natural que esteja ali – e naquela posição –, mas não adianta… O olhar é arrebatado pela força de mil ímãs e mira na direção exata.
Depois de reparar que todos olhavam, aproveitei-me do fato de estar trinta, quarenta minutos de pé, cuidando os filhos no mar, e parei ao lado de um bom exemplar. Então, prestei atenção nas diversas reações dos passantes diante daquele que é feito para guardar e – por que não? – mostrar também. É o que dá a esposa não acompanhar o marido na beira da praia para colocar a leitura em dia: ficamos por ali só pensando em bobagens.
Há os passantes discretos. Estes se aproveitam da coincidência na trajetória e, sutilmente, espicham os olhos. Nada comentam: seguram para si as impressões da visão furtiva, que raramente contempla os detalhes. Às vezes, os passantes discretos estão em duplas ou trio. Nesses casos, um cutuca o outro para todos olharem. Se entre eles está um mais entendido no tema, esperam elegantes passos adiante para comentar algo sobre tamanho, forma ou variedade. Essas coisas. Mas sem alarde.
Os passantes indiscretos, por sua vez, não tomam tantos cuidados. Ao perceberem que não passarão ao lado, mudam desavergonhadamente a rota para se aproximar ao máximo dele. Então, diminuem o passo e afundam olhos invasores com vontade. Chegam a arquear o corpo para ver mais detalhes. Quando em grupo, os indiscretos emitem opinião em voz alta, envaideça quem envaidecer, doa a quem doer. Óbvio: consideram que, se está ali exposto, só pode ser de propósito. No caso de não encontrarem o que de longe esperavam ver, costumam ser sarcásticos.
Por fim, existem os passantes entusiastas. Estes não se contentam em mudar o curso para chegar pertinho: eles param ao lado. Olham com prazer e puxam assunto. Sim, falaram comigo, inclusive. Eu expliquei que mal tinha reparado – estava cuidando das crianças, aquelas dentro da água. Mentira. Notei que os entusiastas, se pudessem, colocariam logo as mãos. (Não, não chegam a tanto. Quer dizer, com oferecimento explícito, sim…) Falam de si, contam vantagem. Mas são, em grande número, ex-atletas, por assim dizer. Seguem adiante com o olhar perdido e uma nostalgia de dar dó.
Pois: nos trinta, quarenta minutos em que fiquei parado feito um poste na beira do mar, um olho zelou pelos filhos e o outro observou a reação dos passantes para ele, à minha esquerda. De modo discreto ou ostensivo, parando ou seguindo adiante, raríssimas exceções, todos olharam para o pequeno balde plástico (fazendo a função de samburá) do pescador que estava adiante. Foi o que bastou para me convencer de quão fascinante e mágico é este objeto na beira da praia. Irresistível.
E invariavelmente,os pescadores de qualquer calibre, não gostam muito destas olhadinhas e das perguntinhas:
– Como é que está hoje? Já deu alguma coisa?
Ou elogios aos pequenos peixes:
– Puxa, bonito o Papa-terra!
A não ser que realmente o Papa-terra seja daqueles de dois palmos.
Pior: em janeiro e fevereiro, por diversas razões, os papa-terras de dois palmos são raros…
Abraço,
Rubem
Ehehehehehe.
Confesso que fiquei curiosíssimo pra descobrir que objeto esconderia tanto duplo sentido. Eheheheh.
Abração, Rubem.
Grande Augusto!
Abraço,
Rubem