Todo casamento, seja ele celebrado no altar, no cartório ou em acordos menos formais ‒ mas tão sérios quanto ‒, traz consigo um manancial de regras. Basta lembrar das frases proferidas pelo sacerdote: na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza, amando e respeitando etc e tal. Ou recordar o fato de que, no momento em que firmarmos um contrato de comunhão parcial de bens, por exemplo, toda uma jurisdição estará ali aglutinada. Quando nada é assinado, as leis do concubinato, quer se queira ou não, passam a rechear o colchão matrimonial ‒ conforto para alguns, insônia para outros. O que pouco se fala é dos princípios jamais ditos ou escritos, porém moldados e sacramentados pela tradição. Dentre eles, um dos que mais apavora os homens compila os deveres e direitos de cada uma das partes com relação ao aniversário de casamento.
Há quem defenda que um homem tem o direito de deixar escapar a data em que aconteceram as núpcias. Não que seja esse um direito líquido, muito menos que seja ele certo. Digamos que esteja enquadrado na categoria dos direitos adquiridos. Explico: o primeiro aniversário jamais pode ser esquecido. Jamais! Teoricamente, dentro do intervalo de um ano, ainda ferve nas veias o calor da paixão. Em seu nome, muitos fogos de artifício estarão posicionados para comemorar a data. Ignorar solenemente tal bateria é um pecado inominável, uma insensibilidade brutal, um desperdício ridículo. Do segundo até o quarto aniversário, com ou sem filhos, o lapso passa a ser incomum, mas já existe quem faça jus ao direito de mosquear.
Entre o sexto e o sétimo ano, em média, os homens começam gradativamente a obter um certo direito de esquecer a data que está impressa em baixo relevo no ouro da aliança. Sabe como é: muito trabalho, correria, responsabilidades… Futebol, música, pescarias, chopes, essas coisas de maridos. Com a atenção voltada mais para datas como as do vencimento do cartão de crédito, o prazo do imposto de renda ou a entrega de um relatório, os dias, semanas e meses se embaralham e, quando se vê, o dia chegou. Pior: chegou ontem. Muito pior: chegou semana passada. Aí bate a culpa… Porém, entre o décimo segundo e o décimo terceiro ano de matrimônio, se as falhas persistirem, a tal culpa acabará esquecida também.
Bom, mas se nós homens temos, ou adquirimos, o direito de esquecer a data de aniversário de casamento sem fazer disso um pecado mortal, nem por isso nos furtamos de alguns deveres. É nossa obrigação, claro, cobrar da esposa a razão pela qual ela abandonou um dos seus hábitos mais elementares: o de nos dar indiretas pouco antes do dia chegar. Ora, se ela jamais esquecerá a data, se ela sabe por tradição que corre o risco de ver o dia passar em branco, se ela conta com aquele jantar especial, por que atirar sobre nossos ombros toda a responsabilidade? Isso não faz o menor sentido! Nós crescemos assistindo nossas mães lembrando nossos pais de compromissos dessa natureza. Não é justo que, logo agora, não tenhamos mais esse direito. Devemos reclamar!
Outro dever do homem é o de cuidar especialmente dos quinquênios (nossa, que falta faz o trema…). O quinto, o décimo, o décimo quinto aniversário de casamento, e assim por diante, pede um esforço extraordinário de atenção. Fica abolida a regra das dicas por uma razão sórdida: elas estarão nos testando e, por isso, pouco darão pistas sobre a proximidade da data. Também existe compromisso tácito de presentear a esposa com algo marcante a cada cinco anos. O momento não é bom? Deu um presentão ano passado? Acabamos de nos mudar? Azar o seu! Faça o possível, o impossível e, de preferência, faça uma surpresa. É injusto dizer que as mulheres servem-se da memória tão somente para o mal. As recordações funcionam às vezes para o bem, garanto. Por isso, outro dia maravilhoso e inesquecível contará muitos pontos na relação. Ou, Deus nos livre, no indesejado rompimento. Lembre-se disso.
A propósito, ao meu anjo, Feliz (nosso) Aniversário!