Aconteceu algo estranho comigo durante a semana, uma situação que julgava difícil de ocorrer. Quando encontrei um bom amigo lá dos tempos de Universidade, e enquanto conversávamos, chegou até nós o seu filho. Depois das apresentações, estendi a mão ao graúdo rapazinho de onze anos. Ele, que estava de braços cruzados, assim permaneceu, deixando minha mão dependurada no vazio. O pai, atônito, alertou: Vem cá, não vai cumprimentá-lo, meu filho? Ele respondeu apenas com um olhar de surpresa, como quem diz: Está louco? Depois de poucos segundos de perplexidade geral, como quem decodificasse a mensagem não dita, meu amigo explicou: Ah, isso é por causa da Gripe AH1N1…
Ato contínuo, falou-me que o menino estava tão imbuído do espírito de prudência que não permitia que ele chamasse o elevador apertando o botão com o dedo (indicava o cotovelo como alternativa), entre outras atitudes de cautela. Mesmo assim, ainda incrédulo, o pai voltou a pedir que a criança apertasse a minha mão, pois isso seria a atitude mais educada. Neste momento, fui eu a declinar, antes mesmo de ele esboçar alguma intenção: nosso aperto de mãos bem poderia ficar para outra hora, em condições menos adversas. E, convenhamos, todos nós já estávamos com uma boa dose de constrangimento para administrar.
Depois de nos despedirmos, imediatamente me coloquei no lugar do pai (pois também o sou). Fiquei pensando se eu, na mesma situação, poderia fazer algo além do que ele fez. Acho que não… Isto é, partindo do pressuposto de que aconteceu uma conversa entre pai e filho logo adiante – e eu acredito nisso. Como se trata de pessoas educadíssimas, ficara evidente que o menino não estava sendo malcriado, muito menos assim considerava-se. Reagia, isto sim, mecânica e incondicionalmente ao treinamento de prevenção recebido. Para a criança, errado (imprudente, deslocado) fui eu quando lhe ameacei com um temerário aperto de mãos.
Aí está o problema da informação, do treinamento, da orientação em massa. Cada um de nós absorve as indicações para prevenir-se do contágio da Gripe AH1N1 em uma medida extremamente variável. Uns, mais paranóicos, deixam de sair de casa sob qualquer hipótese. Os indolentes passam, no máximo, a lavar as mãos com uma frequência um pouco maior. E, entre o preto e o branco, passa a existir uma enorme faixa gris, clareada ou escurecida conforme julgamentos pessoais. Neste sentido, as autoridades sanitárias fazem o que podem, comunicando atitudes que, a princípio, parecem padronizadas. Mas acabam de mãos atadas diante das tantas interpretações diferentes.
Fiquei um tantinho sem jeito com a situação em que acabei envolvido, a ponto de compartilhar o sentimento com os leitores. De um lado, um menino com medo, ou cuja natureza é a de levar tudo ao pé da letra. Do outro, um adulto (eu) até certo ponto descuidado, confiante ao extremo no organismo e suas defesas. Entre nós, um pai colocado em indefectível saia justa. Depois, refletindo, cheguei à conclusão de que só há uma vacina capaz de prevenir essas circunstâncias: o bom humor. Substituíssemos o aperto de mãos por um largo sorriso e um Olha a gripe!, nenhum desconforto teria nos inoculado.
Apesar de tudo, creio que o pai do menino tenha ficado na pior situação. Não queria estar no lugar dele.
Beto, concordo inteiramente contigo. Daí minha esperança de que tenham conversado sobre o ocorrido, logo depois… Abraço, Rubem