VERTIGEM E OUTROS ESTRANHOS PRAZERES
Coluna do Metro Porto Alegre em 24.07.13
Jamais esquecerei o que disse Pedro Verissimo quando lhe perguntei como tinha sido sua primeira entrevista com o Jô Soares. Respondeu que, na saída, mal lembrava o que se passara, tamanha a intensidade da experiência. Retiro isso das gavetas da memória muitos anos depois porque foi exatamente assim que terminei o encontro “Literatura Grande do Sul” do último sábado, uma iniciativa da Associação Gaúcha de Escritores (AGES) e Centro Cultural CEEE Erico Verissimo (CCCEV). Tive a honra de entrevistar Luis Fernando, pai do Pedro, um ícone da crônica mundial.
Admito (orgulhoso): não tive poucas vezes a conversar com Verissimo nos últimos vinte anos. É algo que acontece desde os remotos tempos em que ia buscar uma então jovem pesquisadora na casa da família, onde estruturavam o acervo de Erico, passando por situações em que até chegou a vazar xixi do nosso filho mais velho quando bebê na cama do casal – desculpe outra vez, Lúcia! Há mesmo um texto de apresentação do mestre LFV na contracapa do álbum de música Instrumental no qual sou baterista, quando ousei pedir e louvei ser atendido. Porém, em nenhum momento estive com o compromisso de fazê-lo falar: quase sempre me irmanava ao seu silêncio – nele natural, em mim reverente.
Para atender a proposta do evento literário da AGES, em que um (mais) jovem escritor apresenta um nome consagrado, tendo chegado a vez do gênero crônica, preparei-me minuciosamente. Compareci aos outros três (poesia, romance e literatura infanto-juvenil), nos quais ficou claro o mérito da iniciativa: verdadeiras aulas abertas. Devia o mesmo aos meus pares, ao grande público e, principalmente, aos alunos e ex-alunos de oficina que lá estavam em peso (obrigado, gente!). Em uma breve/longa hora, foi preciso aglutinar quarenta anos de experiência encantando leitores por gerações – visite a exposição Luis Fernando Humoríssimo no CCCEV e tenha uma ideia. Então, dela, retirar muito aprendizado. Assim aconteceu, segundo disseram.
Segundo disseram? Sim, e aqui entra na história o que falou Pedro e sobre o Jô. Ao cabo, uma espécie de vertigem se apoderou de mim, e pouco mais do que flashes do vivido restavam na memória. Cegueira do excesso de luz. Consciência de que o homem não foi feito para voar, mas subverte essa lógica quando é preciso, caindo em si apenas na hora do pouso. Obrigado, Luis Fernando! Feliz (aliviado?), retornarei aos nossos encontros lacônicos e silentes. Ainda que algo tenha mudado, e eu nem sei bem o quê.