Sobre a perseverança dos mosquitos

Rubem Penz

Li, já não recordo bem onde, a respeito da importância dos cupins. Eles estão entre os tantos, insondáveis e invisíveis seres considerados “faxineiros” de nosso planeta – aqueles para os quais matéria morta é alimento. Para nosso azar, fazemos móveis e utensílios de madeira morta. E, aos cupins, um tronco tombado no mato e as portas, marcos e caixilhos da nossa casa são a mesma coisa: sua sobrevivência. Justo. Nada importa eu condenar ou absolver os cupins: não faz diferença no destino do mundo… Porém, ao conhecer sua vocação, retornei à consciência de que a culpa de agora serem tantos é muito dos homens.

Igualmente, quando penso nas pombas, ratos e baratas, a primeira reação é a de perguntar por que, afinal, precisam ser tão onipresentes? Esqueço estarem eles assim abundantes por consequência dos restos da nossa civilização. No campo aberto, baratas jamais chegam a ser um infortúnio (aranhas que o digam), roedores são predados pelas corujas e pombas estão sempre sobressaltadas por gaviões. Se alteramos o meio ambiente a nosso favor e, inadvertidamente, favorecemos a proliferação de algumas espécies, as queixas devem rumar ao bispo.

Por falar nisso, outra praga que nos assola é a dos mosquitos. Agora, quando o verão se aproxima, nuvens deste inseto dos infernos povoam nossos pesadelos. E, se não bastasse a dengue, outra febre de nome esdrúxulo, cujo vetor zumbe em nossos ouvidos, apareceu para nos fazer companhia: chikungunya. Onde encontrar sapos e pererecas em número representativo em plena cidade para conter tal ameaça? Sem chance. Ainda mais quando a fonte de alimento dos mosquitos só faz crescer…

Pena estar eu entre as vítimas prediletas deste sugador de sangue. Sim: há quem os mosquitos prefiram, e sou parte deste grupo. Como nada posso diante da desventura de ser banquete de minivampiros, resta pouco mais do que admirar algumas de suas características e fazê-las de exemplo. Uma delas é a perseverança. No instante em que escrevo, um mosquito me ronda e tem pressa. Intui que não dormirei agora, nem nesta sala: não há tempo a perder. Deseja pousar no braço esquerdo. Não deixo. Escapa de meus safanões. Mira minha nuca, nunca conseguirá. Ficamos os dois assim, duelando sem trégua. Onde estão as lagartixas, teias de aranha e plantas carnívoras quando precisamos delas? E se for um Aedes aegypti?

Como disse, admiro a insistência dos mosquitos. O azar deles que, hoje, me valho de seu modelo de perseverança. Vem! Pode vir que estou esperando atento e forte. Isso, ou atue de solapa, feito os cupins.

Crônica publicada no Metro Jornal em 04.11.2014

gostou? comente!

Rolar para cima