Rubem Penz
Cara criança nascida até 1996 e, especialmente, antes desta data,
Recebi em tempos mais ou menos pretéritos suas cartinhas de boas recomendações e, nelas, você pedia bons presentes. Dizia com letra caprichada que se comportara bem, havia boas notas na escola, a obediência aos pais era uma constante, convivia em harmonia suficiente com os irmãos ou, se único, com os colegas, primos e vizinhos. Respeitava os mais velhos, principalmente o vovô e a vovó, os mestres e o tio ou tia da van escolar. Sempre acreditei, sempre me comovi, sempre procurei cumprir minha parte neste acordo de louvor ao esforço e ao mérito.
Porém, você cresceu e, considerando-se dispensado de prestar contas com esse velho aqui, começou a relaxar, dar de ombros para as tarefas, vacilar feio. Esperei em vão atualizações condizentes com as novas faixas etárias. Podia ser coisas simples, tipo:
“Caro Noel, este ano não furei a fila do trânsito andando pelo acostamento, respeitei o semáforo e a faixa de pedestre, procurei me ater à velocidade indicativa em toda a via – e não apenas diante do pardal – e passei em distância segura pelos ciclistas…”
“Noel, querido, este ano fui fiel ao meu marido (ou esposa), não flertei em redes sociais às suas costas, mantive-me longe da tentação de barbarizar com um perfil falso e cuidei para que os amigos não ficassem com a impressão de ser sacana – fosse verdade ou mentira conveniente…”
“Noel, amigo velho, comportei-me corretamente em redes sociais: nenhuma notícia com origem duvidosa seguiu adiante pela minha página, fui cordato e elegante nas caixas de comentário alheias, nenhum pré-julgamento saiu de meu teclado para atacar a honra dos outros…”
Por isso, escrevo essa carta-resposta. Não que me sinta abandonado ou coisa assim: sempre há novas crianças e novas cartas para ocupar a rotina deste idoso e, com frequência, recorro à Mamãe Noel para encontrar meus óculos de leitura. O problema é desconfiar de que, desfeito o antigo compromisso, você se considere autorizado a praticar pequenas e grandes artes no dia a dia, como se não fosse feio igual. Digo agora: é muito feio, sim! E tenho visto.
Antes de encerrar, vou eu, dessa vez, fazer um pedido:
Deseja um bom presente? Um bom futuro? Então preste bastante atenção em quem você costuma votar, e não só nos outros da “oposição”. Olhe para seus enriquecimentos, suas alianças espúrias, seus votos corporativos. Eles não têm a menor coragem de prestar contas comigo, mas precisarão prestar contas com você. Use bem o voto e Feliz Natal!
Com carinho, Noel
Eu recebi uma carta do correio do papai Noel mais eu sei se vou receber o que eu berdi
Vamos pensar positivo, Kauanne!
Abraços, Rubem
Adolpho Goldman 312