Sobre as melhores dificuldades
Rubem Penz
Certa vez ouvi da Clara uma frase mais ou menos assim: “Pai, não é fácil ser irmã do Ivan”. Se não respondi para ela com o que vou dizer agora, foi um erro, pois deveria dizer: “Ô, como eu sei. Sou irmão da Carla e da Tina, e isso também não é nada fácil…”. Em ambos casos pesa a comparação. Ou melhor – cobra a expectativa.
Tais fatos remontam a mais tenra infância. Começou desde o apelido de berço, unânime na família, extensivo à praia e outros pequenos círculos: Mano. Vejam que, ao nascer, tornei-me referido, o irmão. Onde eu fosse, com quem estivesse, o que viesse a fazer, jamais estaria só – levaria as irmãs comigo. Afinal, quem é Mano pede o complemento: mano de quem? Delas, das irmãs. Certo, certo, isso é uma reflexão adulta e em retrospectiva. Obviamente jamais compreendi a força do apelido naquele momento, nem tive crises de identidade. Até…
Até entrar para o colégio. Não, minto, para o Ginásio (que era como nominávamos o prédio anchietano onde cumpriríamos o primeiro e o segundo grau, antigo ginasial e científico ou clássico, hoje ensino fundamental e médio). Foi neste momento, com agravantes a cada ano, que parei nas mãos de professoras e professores a lerem um sobrenome conhecido e perguntar o que eu era das gurias. Irmão, respondia. E brotava no semblante do interlocutor um largo sorriso – esse seria dos bons, não incomodaria e tiraria ótimas notas. É, mais ou menos. Bastava um bimestre para o sorriso se desfazer. Em três, dava espaço à preocupação. Bom, ao menos nunca rodei de ano.
A qualquer um que me tenha em boa conta, reservo uma certeza: então, precisam conhecer minhas irmãs.
Porém, é hoje que vejo com evidência cristalina as pessoas incríveis que são minhas irmãs! Como aprendi coisas com elas, quanto sou melhor apenas por tê-las a guiar os passos seja pelo exemplo, seja em forma de conselhos e mentoria. Quantas vezes recorri e recorro a elas para ter mais firmes as convicções, mais seguras as escolhas. Fora as incontáveis vezes em que beijei a lona nesta vida e, mesmo distantes, elas souberam amparar meus fracassos. A qualquer um que me tenha em boa conta, reservo uma certeza: então, precisam conhecer minhas irmãs. Se há um remédio contra ego inflado, é tê-las em minha vida. Ainda que não seja fácil, é ótimo.
Antes de terminar, há complementos: o caçula chegou, depois, para jogar bola, xadrez, estudar, tudo melhor do que eu. Ele, sim, devolveu o sorriso aos professores. E, se não bastasse, revendo o início do texto, deveria dizer para a filha: “Querida, difícil MESMO é ser pai de vocês, pois a comparação me deixa em franca desvantagem”. E sigo nesta vida de patinho feio, curtindo a todo instante a melhor dificuldade do mundo: ter uma família insuperável.