Entre o já e o ainda
Rubem Penz
Dentre as inúmeras maneiras de definir a idade adulta, encontrei uma interessante: ela, a tal idade adulta, é o grande intervalo entre o já e o ainda. Para testar sua validade, pincei uma série de ações miúdas, cotidianas, corriqueiras. Banais. E não é que funcionou?
Adulto é quem já alcança os armários aéreos da cozinha e quem ainda alcança os armários.
Adulto é quem já dirige automóveis e quem ainda dirige automóveis.
Adulto é quem já resolve as rotinas da casa de forma independente e quem ainda resolve as rotinas da casa.
Adulto é quem já pode beber com os amigos e quem ainda pode beber com os amigos.
Adulto (homem?) é quem já tira uma mulher do chão e quem ainda tira uma mulher do chão.
Adulto é quem já mobiliza certos olhares quando entra na sala e quem ainda mobiliza certos olhares.
Adulto é quem já sabe o significado dos certos olhares e quem ainda se lembra ao que me refiro.
Adulto é quem já abre um vidro de conserva com as mãos e quem ainda consegue abrir.
Adulto é quem já toma a iniciativa de conter uma pessoa agressiva e quem ainda é capaz de fazê-lo.
Adulto é quem já comanda um grupo de trabalho e quem ainda comanda um grupo de trabalho.
Adulto é quem já tem a opinião levada em conta e quem ainda tem a opinião levada em conta.
Adulto é quem já é imputável e quem ainda é imputável.
Adulto é quem já é capaz de trocar o botijão de gás e quem ainda é capaz de trocar o botijão de gás.
Adulto é quem já suporta o peso de suas renúncias sem se queixar e quem ainda suporta o peso de suas renúncias sem se queixar.
Olhando assim, notamos que muitos custam a ser adultos, outros amadurecem cedo, bem cedo. Além do mais, há quem estique a fase até uma idade cronológica insuspeitada, enquanto outros abrem mão antes do tempo – por vontade própria ou infortúnio.
Bom, já vou terminando por aqui enquanto a tese ainda para em pé…