O primeiro consenso

O primeiro consenso

Rubem Penz

Desde a redemocratização, raros foram os instantes em que estivemos livres da armadilha do “nós contra eles”. Na recente eleição, ou antes, nos momentos de campanha Lula X Bolsonaro, o apego a esta lógica apertou o nó da forca. Afinal, “nós” passou a ter dois lados; “eles” também. Curiosamente, ambos apegados aos conceitos de virtude e, por reflexo, denunciando a iniquidade alheia. Até Roberto Alvim citar Goebbels ao som de Wagner.

Eis que o ministro cai formulando o primeiro consenso – Hitler, não! Porém, sejamos francos: atirar o nazismo para o lixo da História não é o que se pode chamar de novidade. Se há formas imperdoáveis, uma delas é a suástica. Nem toda relativização seria suficiente para garantir sua permanência. Xô nazismo, para esquerda e direita, é um acordo.

Alentada seja esta oportunidade.

Bom, agora que todos somos “nós”, uma certa turma bem pode olhar para os lados – e para dentro –, e extirpar modos e costumes praticados por maus “eles”. Exemplos? Racismo: nenhuma sociedade é virtuosa quando parte de presunções de supremacia étnica. Homofobia: o desrespeito às orientações sexuais não contribui para uma sociedade harmônica e plural. Imposição religiosa na política: nunca vem de Deus, é obscurantismo puro e, com isso, faz nascer o mesmo direito ao outro, fomentando sangrentas “guerras de fé”. Censura: jamais.

Bom, agora que todos somos “nós”, outra certa turma bem pode olhar para os lados – e para dentro –, e extirpar modos e costumes praticados por maus “eles”. Exemplos? Corrupção: o assalto ao erário e as trocas de vantagens não se justificam por nobres finalidades – é sim enriquecimento ilícito. Crimes hediondos: sequestrar, traficar e assassinar é muito grave, e o poder nascido da violência deve ser severamente punido, sem trégua. Corporativismo: a criação de intocadas castas na sociedade, ou de leis em causa própria, não combina com as igualdades democráticas. Patrulha: jamais.

Preciosa oportunidade. Agora é cobrar de “todos nós”.

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