Por fora das bolhas
Rubem Penz
Afronto um dos primeiros ensinamentos da crônica, o qual diz que jamais devemos pedir ao leitor não ler o texto (pois ele não cai nessas provocações infantis e nos obedece), para começar assim: se gosta de lacrar, não siga adiante. Os conselhos aqui contidos existem para quem está disposto a ser lido por quem está fora das bolhas e, assim, ganhar uma inaudível simpatia da maioria silenciosa, além de, na melhor das hipóteses, merecer o desprezo dos aguerridos. Isso, ou ofensas iguais com o sinal trocado.
Pode parecer loucura, mas é verdadeiramente possível escrever críticas a A, B ou C, ou mesmo tecer elogios, sem causar desconforto. Sem provocar paixão ou ódio. Sem subir no palanque ou atirar tomates. Sem vincular sua biografia a quem não merece – ou seja, ser rotulado para sempre como partícipe de atos ou cúmplice de figuras que não moveriam um lápis em sua defesa, caso algumas suspeitas lhe fossem imputadas. Enfim, sem ser massa de manobra.
… jamais caia na esparrela de que um “bem maior” espera de nós a adesão cega…
A primeira dica é quase pueril: quando falar sobre algo que você discorda, fuja dos adjetivos e dos ataques pessoais. Em especial aos adjetivos “da moda”, cunhados por militantes de A, B ou C. Isso porque provocará a ira dos inimigos? Não, claro – se você acha que tem inimigos, quer mais é atingi-los! Outrossim, por causa da impressão deixada em todos os que não estão entrincheirados (a maioria, suspeito). Quando pessoas normais leem um adjetivo engajado, as opiniões deixam de ter valor em si e passam a ser parciais. Há uma repulsa instintiva.
A segunda dica segue a mesma lógica: na hora de elogiar (ou defender), não o faça com base em comparações insidiosas. Ninguém que seja capaz de ler e interpretar textos deixará de notar as agressões subliminares. Ou o tema em questão tem valor em si, ou terá valor relativo e sujeito às subjetividades. Há dados do passado importantes para compor a linha de raciocínio? Busque apenas os dados – quem junta um mais um para encontrar o dois saberá fazer as ilações por si. Resumo: não queira convencer – seja convincente.
Por fim, jamais caia na esparrela de que um “bem maior” espera de nós a adesão cega para que que foi, é ou será feito por A, B ou C. Não cabe aos cidadãos higienizar biografias de pessoas públicas ou justificar atitudes condenáveis. Nem mesmo relativizar. Seguindo as duas dicas acima, pode-se falar tudo o que se pensa e não agredir ninguém. Agindo assim, é plausível ser lido pela maioria silenciosa – que permanecerá quieta concordando ou discordando. No máximo ofertarão tímidos e amedrontados comentários.
E os militantes? Ah, esses estarão constrangidos e afogados no fel. Uns reagirão como sempre fazem: agredindo o autor pessoalmente com adjetivos “da moda”. Outros brindarão o escritor com o desprezo, ocupados que estão em lacrar para sua insignificante bolha.
“Falar o que se pensa sem ofender ninguém” requer boa sintonia com pessoas de diversas opiniões, tolerância, civilidade. Ou seja, bem o contrário da tensão superficial das bolhas. Gostei muito da crônica!
Muito obrigado, Carla!
Beijão!