Rodovigária de Porto Alegre

Não, você não leu errado e eu não escrevi errado. Nem foi obra do acaso ou descuido de digitação. É apenas o desabafo de quem constata ser a Rodoviária de Porto Alegre uma das maiores concentrações de vigaristas da capital. Um viveiro de larápios explorando a fragilidade de quem utiliza este espaço inevitável, pois concentra um dos serviços destinados a uma das nossas garantias constitucionais: o direito de ir e vir.

Enquanto escrevia, Vanessa percorria a via crucis de atividades em auxílio a sua mãe, pela segunda vez furtada na Estação Rodoviária e entorno em menos de um ano – prova de que ali estão atuando quadrilhas especializadas em identificar vítimas com idade avançada, menor malícia ou vigor físico. Dinheiro, cartões e celular suprimidos de dentro de sua bolsa.

Um dos aspectos mais tristes de tudo isso é a primeira reação: responsabilizar a vítima. Penitencio-me por pensar que ela deveria estar mais atenta, andar com menos cartões e documentos, ser prudente ao falar ao telefone e todo o rosário de conselhos mais cabíveis em situações de guerra civil conflagrada. Pior: culpar sua idade. Ela não fez nada de errado e mais viver é uma bênção.

Para esse pessoal, o que falta em caráter sobra em covardia

Para esse pessoal, o que falta em caráter sobra em covardia. É quando sou tomado por outro sentimento digno de vergonha: a vontade de ver uma reação mais enérgica e imediata, a famosa tunda de laço nos vigaristas. Não, não me orgulho de almejar a violência reativa, sem julgamento ou lei. Mas fica muito claro que é a única coisa que temem, caso contrário não escolheriam vítimas sem poder de resistência.

Respirando fundo, volto ao controle. Vamos tratar de reforçar as orientações preventivas, abrandar o trauma, ofertar carinho e consolo. Também aproveito a modesta repercussão do que escrevo para aconselhar quem está com os pais e avós mais velhinhos: façam o mesmo. Prevenir é o que nos resta. E lavro meu protesto: as polícias e a justiça precisam fazer seu trabalho com mais eficiência. O crime, tão certo como a chegada dos ônibus nos boxes numerados, compensa.

14 comentários em “Rodovigária de Porto Alegre”

    1. Muita pena! Os comentários que recebo em direct demonstram ser muitíssimo mais frequente que eu pensava. 🙁 Obrigado, Venâncio

  1. Sabe o que é mais lamentável? É que essa prática de tirar proveito de pessoas de idade não é só dos vigários do entorno da rodoviária. Empresas conceituadas no mercado fazem isso com o conhecimento de todos. Fazem vendas casadas, abrem cartões de crédito, com a desculpa mais deslavada e imoral que existe no mundo: Mas ele aceitou. Ao invés de existir um policiamento sobre estas práticas inescrupulosas, de gente mesquinha que só quer bater meta, nós somos obrigados a exercer policiamento sobre nossos familiares, abalando o que lhes resta em dignidade. Brasil de impunidades e olhos fechados.

    1. Bem isso, Gisele! E ainda tem a máfia do consignado, que sabe da aposantadoria das pessoas até mesmo antes dela mesma! :-/ Beijos

    1. Ataíde Menezes

      Confesso que, pelo título, esperava um texto que falasse sobre religião (associei a vigário). Com um simples neologismo, vc já fisga o leitor, despertando-lhe a curiosidade. Fico triste pelo conteúdo e feliz pela forma. Contundente e muito bem escrito desabafo, amigo Rubem.

      1. Obrigado, Ataíde!
        Desabafar é bom, pena que não resolve… A solidariedeade dos leitores consola bastante.
        Abraços e grato pelos elogios ao texto

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