Pokémons no Brique

Toda cidade que se preze precisa equilibrar-se sobre dois apoios: novidade e tradição. Lamento começar meu raciocínio pelo óbvio, mas ele será uma lembrança útil para completar a primeira frase: toda tradição um dia já foi novidade. A transformação de uma em outra se dá com a passagem do tempo e, principalmente, com a insistência quase teimosa de quem está no comando do processo. Ainda estabelecendo contornos, são bem-vindas pequenas novidades para atualizar as tradições – é quando as coisas ganham formas de legado e sucessão.

Vamos ao exemplo festivo dos 45 anos do Brique da Redenção, nas franjas do também denominado Parque Farroupilha. No princípio, esta atração a céu aberto foi inspirada nas feiras de San Telmo (Buenos Aires) e Mercado de Pulgas (Montevidéu) e seu primeiro nome foi Feira das Pulgas. Eram 24 expositores de antiguidades reunidos e organizados por iniciativa da Prefeitura, gestão de Guilherme Socias Villela. Em 1982, um conjunto de quarenta artesãos e artistas plásticos se instalaram ao lado. Em 1990 uma lei institui o fechamento da Av. José Bonifácio para dar mais segurança e acessibilidade para, em 2000, o Brique da Redenção tornar-se marca registrada.

Eis um modelo bem acabado de tradição que surge, solidifica-se, adota novidades e agrega valor com o passar do tempo. Quando o Brique nasceu, eu tinha catorze anos – e não frequentava, claro, pois antiguidades não chamavam a atenção dos adolescentes. Ao dobrar de tamanho eu estava em idade universitária, e o Brique se transformara em programa dominical, inclusive com o incremento de atrações artísticas. Quando virou marca, eu já tinha dois filhos. Eles, portanto, conhecem e frequentam o Brique desde o berço. E me convidarem a caçar Pokémon por aquelas calçadas pareceu ainda ontem.

Às vezes as pessoas se espantam com minha admiração e reverência ao clássico, ao antigo. Vibro com a restauração de lugares outrora relevantes, sofro com o fechamento de estabelecimentos famosos. É que acima de tudo aprecio o equilíbrio urbano entre novidades e tradições. Encanta-me visitar cidades mais antigas do que minha jovem Porto Alegre – faceira em seus poucos 250 anos – quando constato o respeito quase reverente com a história comercial, arquitetônica, cultural etc. Sem desmerecer as imprescindíveis inovações, a filtragem do tempo é um confiável selo de qualidade.

Será papo de quem já é antigo? É, pode ser… Mas vou dar números para espantar os mais novos: em dois anos, Pokémon e Naruto completarão trinta anos! Ou seja, fiquem tranquilos, meus jovens – o tempo também atua sobre vocês e seus pontos de referência.