Os primeiros passos

São poucos os marcos tão representativos na vida de nossos bebês quanto seus primeiros passos sem apoio. Eles vêm de uma sequência que se inicia no virar-se quando deitado, erguer a cabeça em apoio de mãos, sentar-se sem auxílio, engatinhar, caminhar com apoio para, por fim, caminhar na posição ereta com equilíbrio. De propósito, deixo de fora uma série enorme de habilidades manuais, a ampla compreensão de seu entorno e o início do domínio da linguagem – caso contrário, faltaria espaço na lauda. Tudo isso ocorre, meu Deus, numa média de ano e meio.

Na condição de pai bem passado, ganhei da vida uma tranquilidade alentadora em acompanhar o desenvolvimento psicomotor da Agatha. Outrora me atingia de modo diferente uma certa cobrança social por avanço de metas: já come alimentos sólidos? Já bate palminha? Dá tchau? Sabe onde fica o nariz? E a orelha? Começou a falar? A andar? A dizer (ou gesticular) o não? Dança? Faz rapel? Exatamente como o nascer dos dentes, em cada criança a evolução é particular e os pediatras sempre alertam: há um intervalo e, dentro dele, uma média para tudo. Para que apressar as coisas?

Sobre andar, por exemplo, eis que a caçula começou seu percurso mais oficialmente neste final de semana. Já caminhava amparada por objetos, mãos dos adultos e parede. Também se arriscava entre um daqui para ali que outro trocando o apoio de uma mesinha na direção do sofá. Engatinhadora hábil, parecia-lhe dispensável a posição ereta. Não teve pressa. Muito menos eu: como num jogo, ela abre nova fase com mais severos desafios para quem está ao seu encalço. Como é curiosa e esperta, perderei mais aceleradamente os cabelos.

Neste episódio, houve também um dar-se conta facilitado por seus irmãos adultos, um detalhe que me escapara no passado distante por falta de parâmetros claros. Explico: os primeiros passos são em nossa direção. Soltam-se e caminham para nosso abraço, apoio, amparo. Não olham para o chão – olham em nossos olhos que, certamente, brilham de alegria. Isso dura um dia ou dois. Em seguida, todas as direções serão dominadas e, com o passar do tempo, o caminhar dos filhos tende a levá-los para longe de nós.

Se eu tiver a sorte de uma vida longa, passos hesitantes estarão invertidos. Será quando procurarei os olhares do Ivan, Clara e Agatha. E eles, preocupados, dirão: olha pro chão, pai!

*Aventuras & Desventuras de um Pai Bem Passado

4 comentários em “Os primeiros passos”

  1. Elisabete floriano

    Amei, lindo esse olhar a vida as emoções de um pai realizado na sabedoria do amor presente da filha com visão clara de tantas emoções. Deus abençoe voces

  2. ZULEICA AGUEDA FERRARI

    Texto delicioso! Quando nasce uma criança, nasce um informante para os linguistas. Curta a sua filha e anote todas as falas dela imediatamente para não esquecer. Fiz isso com minha filha. Anotei desde os primeiros balbucios até as frases mais sofisticadas. Depois, guardei todos os cadernos de redação. Digitei tudo e transformei em um livro, com fotos dos aniversários, bilhetes e cartas que ela me mandou. Depois, dei de presente de casamento e ela. Só fiz um exemplar, pois era algo muito íntimo, só nosso. Ela amou.

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