Muitos filmes norte-americanos nos trazem cenas de homens e mulheres jovens – e às vezes nem tão jovens – revendo seus quartos de adolescência quase intactos mesmo depois de muitos anos. Isso sem falar nos ambientes transformados em templos nos casos de filhos mortos, uma tentativa desesperada de perpetuar a presença ou doce de cultuar a memória. Ambas, quem sabe. De tão frequentes, imagino retratarem uma constante: pais preservando a “casa da família”.
Quando penso nisso, constato que, antes de tudo, ela precisa ser uma casa grande, sem a necessidade de dar nova utilidade aos ambientes desabitados além do eventual pouso do antigo ocupante ou, sei lá, de algum hóspede eventual. Também creio que a tal “família” não deva sofrer grandes alterações – um só casal e um só tempo para crianças e jovens ali viverem. Quem permanece trata de custodiar o pequeno museu constituído de enfeites, fotografias, troféus, pôsteres, equipamentos esportivos, instrumentos musicais, livros e antigos armários com roupas de outrora.
Minha mãe ainda mora na nossa “casa da família”. Nela, o antigo quarto das gurias sofreu algumas modificações, mas o dos guris permanece igual no mobiliário. Porém, alterou-se o suficiente para restar nada do que poderia identificar seus ocupantes: nem brinquedos, nem pôsteres, medalhas, fotos, enfeites… Estão longe de ser retratos de época – quem não frequentou a casa teria dificuldade em saber qual quarto seria de quem. Só para nós são os quartos das gurias e dos guris.
Eu também moro na mesma casa em que os manos mais velhos da Agatha viveram a infância. Nela, com as mudanças no núcleo familiar, o quarto da Clara foi todo embora faz anos, transformando a peça no “quarto vermelho”. Ivan e seu quarto permaneceram até perto de ele ter sua própria casa e, mesmo depois, era próximo dos exemplos norte-americanos. Mudou sua natureza quando entramos no cadastro de adoção: decidimos chamá-lo de “quarto verde”, tornando-se o escolhido para receber quem o destino nos reservaria. Hoje, bem faceiro, ele é da caçula.
E como um quarto de menino se transforma num quarto de menina? Bom, de cara permanecendo verde e ganhando da Vanessa todo um astral de floresta nos adesivos de bichos e na estampa da nova cortina. Convivem antigos e novos brinquedos, antigos e novos livros, antigos e novos sonhos. Mesmo amor e cuidado. Por fim, dentre permanências e mudanças, meu toque criativo: transformei a antiga escrivaninha em trocador. Perdoem-me os arquitetos. Prometo que ela voltará às antigas funções quando chegarem os anos escolares…
*Aventuras & Desventuras de um pai bem passado
Fiquei curiosa quanto à destinação do quarto vermelho…
Pois é, Zeni. Hoje ele está “o quarto da vó”. 🙂
Abração
Cada pedaço da nossa história gera novos usos para os ambientes… melhor mudar nos mesmos cômodos do que ter que mudar de casas a cada necessidade. Felicidade para a nova habitante do renovado lugar!
Obrigado, Altino! Ela adora o quarto! Abração!