Número 481
Rubem Penz
Sonhamos acordados e, igualmente, temos muitos pesadelos rondando nossa vigília. Mais: se vários sonhos são comuns a todos, há, também, pesadelos compartilhados. Um deles – dos mais frequentes – é o medo de que ninguém apareça na festa que você organiza com tanto apreço. Confesso meu pânico.
Enquanto quem convida está ocupado com os preparativos (contratando a comida, colocando a bebida no gelo, ajustando os detalhes da decoração), não há clima para temeridades, ou tempo, ou espaço. O foco está em prevenir sobressaltos de última hora, garantir a qualidade dos serviços, estar pontual no cronograma. Cumpridas todas as tarefas, nasce a dúvida: e se ninguém vier?
Pensa-se no prejuízo material, sim. No desperdício de comida, também. Mas o que realmente apavora é o abalo emocional que sofreremos caso ninguém apareça. São minutos que duram horas. As mãos ficam molhadas, os pés inquietos, o pensamento rumina cenários de catástrofe. Por instantes estamos reféns da solidão, e o primeiro amigo será tão importante quanto a silhueta de um navio no horizonte do náufrago. Ele, o primeiro, reconhecerá no abraço recebido o acerto em ter chegado assim cedo.
Mas, se em festas de salão ou residenciais o mico de ser esquecido é ameaçador, ele ao menos tem a vantagem de ser privado. Semana passada estive exposto à mesma angústia, com o agravante de estar em público. Explico.
Programei um jantar entre queridos amigos – a velha e invencível combinação de boa mesa e melhor papo. Como de costume, a lista de presença virtual cresceu feito capim em verão chuvoso. Que alegria! No dia e hora aprazados (aliás, quinze minutos antes, para dar tempo de contornar eventualidades), lá estava eu, solitário, ocupando uma mesa para trinta lugares. Trin-ta lu-ga-res… Ao redor, o restaurante começou a encher.
Paranoico, imaginava os outros a lamentar minha situação, quem sabe por já terem passado por igual suplício. A toda hora o garçom vinha na mesa e me oferecia qualquer coisa – não sei se dividindo a dor ou apenas vendendo seu peixe. Até a chegada da primeira companhia, nem mesmo o excelente chope me fazia feliz. Enfim, com ela, acendeu a luz no fim do túnel. Ah, e o jantar bombou.
Histórias de aniversariantes solitários em meio a bolos, velas e balões vicejam como lendas urbanas. Nunca passei por isso e, mesmo assim, morro de medo a cada festa. Queria ser seguro e confiante como o leitor que agora me rotula de dramático. Mas sou um fraco. O único consolo seria algum comentário confessando igual pesadelo. Você, por exemplo, já viveu esse apuro?
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Duvido que o mais seguro dos homens não sofra com tais pensamentos vez ou outra. Felizmente, na maioria das vezes podemos respirar aliviados e
dizer… foi apenas um pesadelo.
Parabéns meu caro, como sempre é muito bom te ler.
Abraços
Lóris, pois é. E como bem lembrou minha querida mestra Valesca de Assis, esse mesmo pesadelo assombra escritores momentos que antecedem os lançamentos de livros! E completo: aos músicos logo antes do show também!
A mestra tem toda a razão, pior que a Editora sofre junto com o autor, a cada lançamento de livro. E não pára por aí, cada livro ainda tem várias sessões de autógrafos… em várias cidades, livrarias e feiras de livros. Dá pra imaginar por quantos pesadelos como estes um Editor passa por ano???
Será que já criaram um seguro pra estas catástrofes?? hahaha
Verdade! Pior é guardar as sobras inteiras….
Caro Rubem
A gente não controla os pesadelos.
Mas, na vida real, podes deixar de lado qualquer ansiedade a respeito do fato de não aparecer ninguém na tua festa.
Quem iria te deixar sozinho? Atravessaria o Guaíba a nado (mesmo neste inverno tão frio) e escalaria montanhas para te encontrar. Só não enfrento as sombras da noite, que toda pessoa tem seus limites.
Juno-anônima
Jussara,
Muito carinhosa sua mensagem! Fez-me um bem que não imaginas!
Obrigsado, beijos,
Rubem
Sábado passado, organizei um ensaio de banda na minha garagem. O frio era assustador, não veio todo mundo mas foi muito bom!
Para não entrar no pesadelo, me garanti hospedando e pedindo ajuda p a decoração pouco antes da hora. Esperar sozinha? Eu não…
Bem pensado, Márcia! Bem pensado!
Abraços, Rubem