Lava Jato e a lei da oferta e procura

Rubem Penz

Entre os tantos argumentos para resgatar a autoestima brasileira – e para desculpar eventuais “desvios” –, um dos que mais chama a atenção diz que corrupção existe no mundo inteiro e está presente em todos os tempos. Aliás, uma verdade inquestionável. Se fosse diferente, não haveria a necessidade de leis para disciplinar as relações entre indivíduos e organizações das mais diversas, seja na esfera pública, seja na privada. Sim: é péssimo começar uma crônica com obviedades. Porém, que tal resgatar a velha e infalível lei da oferta e da procura para, com isso, entender as razões de a corrupção ser mais comum no Brasil?

O fato é que corromper por essas plagas sai barato. Muito barato. Tão absolutamente barato que, como se fala, podemos praticar com tranquilidade pequenas corrupções no dia a dia. “A corrupção ao alcance de todos” daria ótimo slogan. Como nenhum marqueteiro pensou nisso antes? O que soa como piada, lamento dizer, serve como justificativa para quem lucra ao relativizar a grande corrupção com a tese do “mas, quem aqui não é corrupto?”. Logo, pelas leis de mercado (todos querendo levar vantagem em tudo), a propina deveria subir de preço, certo? Errado.

A oferta brasileira é tão gigantesca, escancarada e onipresente, que nem ter muitos interessados a torna custosa. Compra-se favorecimentos desde os salões dos palácios até os caixotes de camelô. O sistema burocrático e intrincado parece moldado para tal. Tudo conspira a favor. Então, só existe uma maneira de o preço da corrupção subir: mexer a fundo no risco. Ele crescendo, a corrupção sairá dispendiosa e a turma pensará duas vezes. Como fazer isso? Com transparência e punição em moeda forte: perda da liberdade. Ser investigado, julgado e condenado é um preço muito alto até para ricos e poderosos. Nesta perspectiva, valerá a pena negociar propina? Será vantagem comer bola? Haverá disposição para arcar com o ônus? Nisso, a Operação Lava Jato é novo sopro de mudança.

Investigações historicamente barradas explicam a corrupção; processos que caducam justificam a corrupção; condenados em liberdade depois de penas pífias estimulam a corrupção; privilégios quase pornográficos eternizam a corrupção. A certeza de impunidade a faz banal. Apenas o risco tornará o produto raro e menos acessível – questão de oferta e procura. É assim em países desenvolvidos. Pode ser parecido no Brasil. Vender-se e comprar alguém precisa sair caro. Muito caro. Abjeto. Precisa custar a liberdade e a honra dos envolvidos.

Crônica publicada em 15.03.16

 

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