Consciência pública refletida na privada

Rubem Penz

Se você é homem e frequenta os cinemas do shopping localizado na Av. Ipiranga, bairro Jardim Botânico de Porto Alegre, deve ter reparado que todos os três mictórios do sanitário masculino perto das primeiras salas estão interditados por vandalismo. Se você é mulher e esteve recentemente por lá na companhia de algum homem (filho, amigo, namorado), pode ter sabido por ele deste fato. Se você duvida, infelizmente tenho uma foto para provar. Se você considera isso tudo natural (aceitável, coisa de moleque, “do jogo”), estamos com sérios problemas. Se, no entanto, achar isso um horror (como eu), nem assim deixamos de estar com sérios problemas.

O caso, enfim, é grave: em algum bolso de alguma calça dependurada em algum cabide de algum armário em algum dormitório de algum hotel em remoto tempo o conjunto da sociedade esqueceu seus bons valores. E partiu abanando as tranças como se não fossem fazer falta logo adiante. Agora, quando acontece algo tipo essas depredações gratuitas e pouco inteligentes, a mesma sociedade se choca e fica no jogo de empurra: a culpa é tua, é dela, é dele, é da educação, do governo… É do povo. A culpa, digo eu, é de todo pai e de toda mãe que não investiu seu precioso tempo em transferir aos filhos os valores que recebeu em casa. Afinal, faz algumas gerações, neste mesmo país terceiro-(i)mundista, isso não acontecia.

Eu sei, eu sei: educar os filhos dá trabalho. Cansa. Em alguns momentos parecemos enxugar gelo. Em outros, somos chamados de repressores e autoritários. Porém, não conheço nenhuma manifestação maior de amor por um filho do que transmitir a ele bons valores. Nada complexo: sempre pedir licença; não jogar papel no chão; zelar pelo que é teu e, do que não é teu, cuidar ainda mais; não fazer para o outro aquilo que não gostarias que fizessem para ti; agir certo porque é certo, e não porque estão filmando; assumir as consequências dos atos; respeitar os mais velhos; diante de maus exemplos, ter personalidade; ser bem-agradecido. O básico.

Quem estragou de propósito os mictórios públicos (ainda que privados) daquele cinema tem pai e tem mãe. Caso os responsáveis fossem defrontados com um flagrante, certamente diriam: “Filho, eu não te ensinei nada disso”. Mas ensinou, sim, ainda que indiretamente, na medida em que não repassou bons valores. Quem traz de casa a velha e boa educação tem consciência pública e jamais – jamais! – danificará qualquer mobiliário urbano. Cidadãos com valores não têm preço, ainda que sua falta nos custe muito caro.

Crônica publicada no Metro Jornal em 24.02.15

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